segunda-feira, junho 30, 2008

Greatest Hits

Estou totalmente tonto com o que tenho ouvido. Sonho com Billie Jeans mas quando acordo ouço Tim Maia Racional ou as discípulas do INRI Cristo cantando Hotel California e What a Feeling. Esse clima de revival é uma tortura. Parte da desgraça vem do relançamento em CD dos 'clássicos' mas parte vem do Karaoke. Isso não era para ter existido...

Com o arranjo ao fundo as pessoas começam a improvisar cânticos e pregações. Depois gravam e põe na internet uma coisa dessas. Acaba ocupando o espaço dos 'clássicos'. Acho que eu preferia o embromol de churrascaria. Pelo menos me fazia rir e não destruia minhas memórias.

Minha memória era assim: "Welcome to the Hotel California"
e ficou assim: "Descubra INRI CRISTO e conheça sua história"



Estou entre o Movimento Racional (leia o livro, o único livro, Universo em Desencanto), do qual vou poupá-los por enquanto, e as versões místicas. Vou tentar dormir e sonhar com Billie Jeans antes que seja destruída.

Lesa pátria

Ontem entrei na cozinha às 22. Vou cozinhar, pensei. Coloquei uma garrafa de vinho pra gelar e comecei a procurar o que poderia fazer. Precisaria de carne para fazer o de sempre: um carreteiro. É um prato masculino, como o churrasco. Não que mulheres não o façam, mas é prato que o gaudério tem saber fazer. Só não precisa ser o único. Sem charque nem resto de churrasco, tive que me virar com o resto de carne excessivamente passada que nos serviram num restaurante de rua e pedimos para enrolar. Resto do superbifesuperpassado.

O negócio estava até próximo da tradição: resto de carne, cebola, alho e arroz, frita tudo e joga um pouco d'água pra cozinhar. Depois de pronto, espreme um limão, espalha tempero verde e um pouco de ovo picado e bom proveito.

Minha preocupação começou quando eu vi que não tinha mais alho. Como é que eu vou dar um gosto pra esse troço?! Depois piorou quando eu substitui a banha da tradição pelo azeite de oliva para fritar a cebola. Joguei a carne, mexi um pouco e me virei para o vidro arroz: totalmente transparente.

- Carreteiro sem arroz?
- Faz com arroz integral!
- Será...?!

Sem alho. Arroz integral não pega gosto. Esse troço não ai dar certo. Mas já eram 22:30, a primeira taça de Cousino Macul Antiguas Reservas já tinha ido e a fome só aumentava. Quem não tem agulhinha masca cateto.

Lá pelas 23 e tanto... Depois de botar o triplo de água para dar conta de cozinhar o negócio, eu já sabia que não tinha tempero verde nem ovos cozidos.

Queijo parmesão ralado foi uma inovação já aceita e consolidada (numa demonstração de boa vontade na integração do gaúcho com a cultura italiana de cima da serra). Só que eu também não tinha parmesão. A essas alturas, com medo que a gororoba não tivesse outro gosto que casca de arroz, eu peguei um chevrotin bem currado e relei bem fininho, mais fino que fios de ovos.

Na metade da garrafa de vinho, servi o prato. Estupendo. O cozer e recozer fez o gosto da carne entranhar no arroz (puro acaso) e o chevrotin deu um sabor forte que combinou muito com o vinho encorpado (outro acaso).

De acaso em acaso, depois da meia-noite estavámos maravilhados mas eu não consegui evitar uma enorme dor na consciência. Para um gaúcho, um carreteiro virar risoto - por melhor que seja - é um verdadeiro crime de lesa pátria.

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