terça-feira, maio 30, 2006

Auto-de-fé de Elias Canetti

Meu amigo Cássio Cavalli, esperando acertar meu presente de aniversário, em agosto do ano passado, mirou no que viu e acertou também no que não viu.
1) Só pelo fato de ser livro, já é o suficiente para me agradar;
2) Se a edição for cuidada como a da Cosac Naify, melhor ainda;
Até aqui, barbada, nenhuma novidade.
3) Se o tradutor é Herbert Caro, leio maravilhado e agradecido; e (o que o Cássio não sabe, nem poderia imaginar)
4) O primeiro capítulo, que acabo de ler, é sobre um homem (menino) e sua relação doentia com os livros.
Eu venho de uma cidade que não tinha, e não sei se já tem, livraria. Quando eu vinha a Porto Alegre era comum ficar vidrado nas estantes dos sebos e nas vitrines das livrarias. E muitas vezes, "qualquer livro, mesmo os ruins, dava-lhe (me) vontade comprar", e, mesmo inconscientemente, eu carregava livros - muitos dos quais nunca li - e também "confiava na sua (minha) pasta atulhada de livros como forma de resistir à tentação".
Ora, algumas pessoas pensam em casa com piscina, com churrasqueira, com hidromassagem, com duas garagens, sei lá o que mais... Eu sempre pensei em uma casa com livros. Minha sogra quase ia à loucura: "eles têm livros, um quadro na parede, e não têm mesa, cadeiras, nem sofá. Comem sentados no chão!".
Minha relação com os livros tem três fases: 1) quando eu tinha tempo para lê-los mas não tinha dinheiro para comprá-los; logo depois, 2) quando eu passei a ter dinheiro mas tinha vendido todo o meu tempo; e agora, 3) que espero poder comprar menos livros e ter algum tempo para lê-los.
Agradeço ao Cássio pelo presente, que não sei se terminarei de ler, mas que já me valeu.

quarta-feira, maio 24, 2006

Quiz Copas do Mundo




O Chico me mandou um quiz sobre as Copas do Mundo com três graus de dificuldade:
Fácil - eu acertei 28 das 30;
Médio - acertei 18 das 30; e
Difícil - acertei 8.
Tudo bem, todas sem consulta alguma...

segunda-feira, maio 22, 2006

La Rosa

La rosa,
la inmarcesible rosa que no canto,
la que es peso y fragancia,
la del negro jardín en la alta noche,
la de cualquier jardín y cualquier tarde,
la rosa que resurge de la tenue
ceniza por el arte de la alquimia,
la rosa de los persas y de Ariosto,
la que siempre está sola,
la que siempre es la rosa de las rosas,
la joven flor platónica,
la ardiente y ciega rosa que no canto,
la rosa inalcanzable.

J.L. Borges, de seu primeiro livro - Fervor de Buenos Aires -, influência reconhecida, citada e aludida por Umberto Eco no romance com o nome da...

sexta-feira, maio 19, 2006

Feliz, Insuportavelmente

Aos poucos a luz perde o resplendor.
O rio sabe a sangue, e ninguém sabe.
É a derradeira chance de me ver
pela primeira vez inteiro: cara a cara.
Simplificar prefiro. Por que hesito
em revelar as águas escuras
que me percorrem, essas onde moram
peixes cinzentos, surdos, que me sabem?
Dizer me basta que não cometi
o pecado maior do homem:
o de não ser feliz (O juízo é de Borges,
que era cego, mas descobriu a rosa
escondida no coração da moça.)
Eu vi o fundo de um lago de esmeraldas.
Fui feliz, insuportavelmente.
As desgraças que duras me feriram
nada foram (contando a de existir)
ao lado dos milagres que vivi,
dos mágicos momentos que inventei.
Não é preciso ir longe. Numa noite
de ardente primavera viajei,
abraçado aos cabelos desvairados
que me ensinavam o cântico dos cânticos,
pelo mar dos espaços siderais.
Voltei intacto. Parece que passaram
eternidades.
Sozinho agora sou: perante mim,
ou entre mim e a noite que me chama,
espaço em que mal cabe o que escondi.
E mais de meio século de festa,
de lágrimas, de assombro, de ternura,
inútil se resume na fagulha
fugaz do tempo em que meu ser total,
resíduo de memórias, já se adere
– imperceptível –
ao silêncio noturno da floresta.

(Thiago de Mello)